“Escreva num livro o que você vê e envie a estas sete igrejas: Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodiceia”. (Ap 1.11)
Vamos ao contexto
A cidade de Laodiceia estava situada no vale banhado pelo rio Lico, antiga região do centro da Ásia Menor. Ficava também no entroncamento de três estradas importantes, o que contribuiu para que a cidade se tornasse um centro bancário e industrial de destaque.
Originalmente chamada de Dióspolis ou cidade de Zeus, depois Rhoas e posteriormente ao ter sido ampliada e engrandecida por Antíoco II Theos, rei da Síria, a cidade mudou o seu nome para Laodiceia, em homenagem à sua esposa Laodice.
Como a cidade era conhecida por seus grandes mercados e casas de câmbio, seus cidadãos eram orgulhosos, arrogantes e satisfeitos consigo mesmos. Era um local tão rico que, logo após um terremoto (60-61 d.C.), Laodiceia foi capaz de financiar a reconstrução com recursos próprios, sem necessitar do tesouro imperial, como as demais cidades.
Perto da cidade havia um bom número de fontes de água mineral fria, quente e morna. O povo acreditava que as águas possuiam propriedades curativas. Apesar de serem próprias para banhos, as águas mornas eram de sabor desagradável e produziam náuseas. Os banhos mornos e as fontes minerais atraíam muitos visitantes da Europa e da Ásia.
Destaques da cidade de Laodiceia
Havia outros destaques em Laodiceia: o belo tecido negro de lã, que era usado para fazer roupas e tapetes, uma escola de medicina conhecida por sua pomada para tratamento dos ouvidos e o “pó frígio” que era usado para fabricar colírio.
Em relação à igreja, ela era muito parecida com a de Sardes, onde o cristianismo era nominal e acomodado. É provável que Epafras, de Colossos, tenha sido seu fundador.
Durante a leitura da carta à igreja de Laodiceia não há identificação de perseguições por funcionários romanos, nem dificuldades com os judeus ou qualquer tipo de falsos mestres dentro do contexto.
Influência mortal sobre a vida espiritual
Muitos membros participavam ativamente da alta sociedade e parece que essa riqueza econômica exerceu uma influência mortal sobre a vida espiritual da igreja. Logo, tudo indica que os cristãos foram tomados pela indiferença.
Mais uma vez, podemos observar que as igrejas que enfrentaram grandes dificuldades foram aquelas que mais se aproximaram de Deus.
“Ao anjo da igreja em Laodiceia escreva: Estas são as palavras do Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o soberano da criação de Deus.” (Ap 3.14)
Amém é uma palavra hebraica que expressa a ideia de veracidade “assim seja”. O termo veio de Isaías 65.16 onde Deus é chamado de “Deus do amém” termo que foi traduzido pela Septuaginta como “Deus verdadeiro”. Quer dizer que Deus fará conforme tudo o que prometeu e que suas palavras são confiáveis.
“Conheço as suas obras, sei que você não é frio nem quente. Melhor seria que você fosse frio ou quente!” (Ap 3.15)
A carta aos laodicenses não apresenta nenhum elogio e nem críticas por ensinos falsos e imoralidade. O problema deles era a mornidão. Eles não tinham a frieza daqueles que hostilizavam o Evangelho e ao mesmo tempo rejeitavam a fé. Mas também não tinham o fervor daqueles que morriam pelo nome de Cristo. Eles eram simplesmente acomodados.
As águas da cidade vizinha, Hierápolis, eram quentes e terapêuticas. Já as águas de Colossos eram frias e refrescavam seus habitantes. Laodiceia ficava entre essas duas cidades e suas águas vindas do lençol freático eram mornas e salgadas, ou seja, não eram boas para o consumo. Cristo comparou as águas da cidade com a situação espiritual da igreja.
“Assim, porque você é morno, nem frio nem quente, estou a ponto de vomitá-lo da minha boca. Você diz: Estou rico, adquiri riquezas e não preciso de nada. Não reconhece, porém, que é miserável, digno de compaixão, pobre, cego e que está nu.” (Ap 3.16-17)
Ser frio ou ser quente são duas condições que oferecem alguma utilidade, sendo assim, a vida espiritual morna da igreja não servia para nada, era nauseante.
“Vomitar” é um verbo que simboliza a expressão do juízo divino contra Laodiceia. Caso ela não se arrependesse deixaria de ser igreja, ainda que continuasse existindo como instituição humana. As palavras fortes sacudiram a igreja de sua indiferença espiritual.
O que significa ‘ser rico’?
A prosperidade em si não significa nada. Analise agora a situação da igreja brasileira que se envolveu com a “teologia da prosperidade”. Há muitos cristãos imaginando que o sucesso financeiro é o alvo da vida cristã, interpretando Deus somente como o dono da prata e do ouro.
A prosperidade material não é necessariamente sinal da bênção de Deus, pelo contrário, é algo que pode até distrair e afastar as pessoas dos propósitos divinos.
Perceba que a riqueza estava também acompanhada do orgulho. Mas Deus os chamou de “miserável, pobre, cego e nu”. Apesar de se sentir rica, a igreja em Laodiceia era reconhecida por Cristo como digna de compaixão, como um mendigo cego, sem recursos e vestido com trapos. A palavra “nu” quer dizer “insuficientemente trajado”. Você acha que, como igreja, somos uma Laodiceia moderna?
“Dou-lhe este conselho: Compre de mim ouro refinado no fogo e você se tornará rico; compre roupas brancas e vista-se para cobrir a sua vergonhosa nudez; e compre colírio para ungir os seus olhos e poder enxergar. Repreendo e disciplino aqueles que eu amo. Por isso, seja diligente e arrependa-se.”(Ap 3.18-19)
O “ouro refinado no fogo” é uma linguagem metafórica encontrada no livro de Isaías, quando o profeta chamou os famintos e sedentos para comprar vinho e leite sem dinheiro e sem preço.
“Venham, todos vocês que estão com sede, venham às águas; e, vocês que não possuem dinheiro algum, venham, comprem e comam! Venham, comprem vinho e leite sem dinheiro e sem custo.” (Is 55.1)
É uma comparação que descreve o valor inestimável das bênçãos no Reino do Céu. Não há dinheiro que compre o que vem de Deus. Quem teria condições de comprar ouro puro do próprio Deus?
Quanto às “roupas brancas”, a igreja é convidada a vestir-se, ou seja, a cobrir sua nudez com pureza e sinceridade, pois esse é o simbolismo da cor branca.
O “colírio para ungir os olhos” se encaixa no contexto de Laodiceia. A própria cidade era um “centro médico” especializado na fabricação do “pó frígio” que era usado para produzir colírio. Os médicos frígios ajudavam as pessoas em sua cegueira física, mas somente Jesus Cristo poderia curá-las de sua cegueira espiritual.
Então, perceba aqui as soluções oferecidas por Jesus para a miserabilidade do povo: ouro para sua pobreza, vestes brancas para sua nudez e colírio para sua cegueira.
As palavras de Jesus, como Ele mesmo disse, eram para “repreender e disciplinar”. Não eram punitivas, mas corretivas. Quer dizer que há esperança para a igreja até os dias de hoje.
“Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei e cearei com ele, e ele comigo. Ao vencedor darei o direito de sentar-se comigo em meu trono, assim como eu também venci e sentei-me com meu Pai em seu trono.” (Ap 3.20-21)
Cristo continua à porta do coração de cada pessoa procurando entrada e, “abrir a porta” é uma decisão, não uma imposição da parte Dele.
“Respondeu Jesus: Se alguém me ama, guardará a minha palavra. Meu Pai o amará, nós viremos a ele e faremos nele morada.” (Jo 14.23)
O termo também dá a entender que a igreja em Laodiceia tinha deixado Jesus do lado de fora, de forma que Ele estava à porta batendo, e pedindo para entrar.
Sobre “cear com Jesus” era um termo com significado no contexto judaico antigo, ou seja, símbolo de intimidade, afeição e confiança. Os fariseus chegaram a criticar Jesus por comer junto com publicanos e pecadores. Relembre aqui:
“Todos os publicanos e pecadores estavam se reunindo para ouvi-lo. Mas os fariseus e os mestres da lei o criticavam: Este homem recebe pecadores e come com eles.” (Lc 15.1-2)
Pedro também foi criticado pelo mesmo motivo. Perceba no texto que o fato de Pedro evangelizá-los não parecia ser problema. A questão era comer junto com eles:
“Assim, quando Pedro subiu a Jerusalém, os que eram do partido dos circuncisos o criticavam, dizendo: Você entrou na casa de homens incircuncisos e comeu com eles.” (At 11.2-3)
E o que Jesus está prometendo aos laodicenses é justamente essa intimidade e essa comunhão tão criticada pelos judeus. Além disso, “ter o direito de sentar-se com Jesus no trono” era uma metáfora que ilustrava a vitória final dos santos — a entronização.
Pessoas com direito a se sentar no trono são pessoas vitoriosas de acordo com a ideia teológica. A situação atual da igreja é temporária, pois Cristo já está entronizado à direita do Pai e prometeu a entrada a esse Reino para aqueles que permanecerem fieis até o fim.
Lembrando que as promessas expressas em cada carta são dirigidas a todas as igrejas, de todos os tempos.
Conclusão
A Igreja dos tempos atuais tem muita afinidade com a Igreja dos tempos de Laodiceia, com exceção da Igreja Perseguida. Nossos templos são confortáveis, a Palavra de Deus é pregada corretamente e a música é de qualidade. Fazemos bem a obra, temos dons e talentos e muitos se orgulham disso.
Mas não foi essa a proposta de Deus para nós. Não é este o plano. A Igreja como corpo de Cristo não foi formada para viver isolada do mundo e não deve existir como um “aquário” com seus peixes ornamentais.
Muitos se sentem tão acolhidos e queridos dentro da igreja que se esquecem da sociedade que está do lado de fora. São pessoas “mornas” que não fazem a menor diferença, ou seja, não servem para nada.
Nós, como Igreja de Cristo, devemos agir como Jesus e se parecer com Ele em todos os aspectos. Não podemos mais nos fechar como um clube, mas precisamos nos abrir para a realidade do Reino de Deus. Ao praticar o verdadeiro cristianismo, o céu desce e o sobrenatural acontece.
Jesus continua dizendo: “Conheço suas obras”, “Obedeça e arrependa-se”, “Estou batendo na sua porta”, “Venham a mim quem tem fome e sede”, “Guarde a minha Palavra”, “Fortaleça o que resta e que estava para morrer”, “Volte ao primeiro amor”. O tempo está chegando! “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas”.
E esse foi o estudo desta semana. Espero ter tirado sua dúvida e também colaborado para seu crescimento espiritual. Beijo no coração e até a próxima, se Deus quiser!
Por Cris Beloni, jornalista cristã, pesquisadora e escritora. Lidera o movimento Bíblia Investigada e ajuda as pessoas no entendimento bíblico, na organização de ideias e na ativação de seus dons. Trabalha com missões transculturais, Igreja Perseguida, teorias científicas, escatologia e análise de textos bíblicos.
*O conteúdo do texto acima é de colaboração voluntária, seu teor é de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.
Leia o artigo anterior: Entenda o que Jesus disse às 7 igrejas de Apocalipse: Filadélfia